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Entre quatro paredes

Por: Angieli Maros

Maria, 61 anos, é biofarmacêutica, mãe de duas filhas e separada. Do casamento – muito conturbado – não sobraram amizade nem boas lembranças, mas apenas uma sensação de injustiça e uma cadeira de rodas que a acompanhará para o resto da vida: em 1983, o então marido, professor universitário, atirou contra ela, simulando um assalto e deixou-a paraplégica. Duas semanas depois, ele ainda tentou eletrocutá-la durante o banho. Foi quando Maria da Penha finalmente decidiu separar-se.

Hoje, Maria da Penha é coordenadora da Associação de Estudos, Pesquisas e Publicações da Associação de Parentes e Amigos de Vítimas de Violência (APAVV), no Ceará, e as torturas que sofreu foram consideradas, pela primeira vez na história, um crime de violência doméstica. O ex- marido só foi punido depois de 19 anos e ficou preso  apenas dois anos em regime fechado.

No Brasil, no dia sete de agosto de 2006, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou a lei Maria da Penha, que cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher.

Violência não se justifica


Casos de violência contra as mulheres não são episódios isolados. Segundo o estudo ‘Está em nossas Mãos. Basta à Violência contra a Mulher’, publicado em 2004 pela Anistia Internacional, uma em cada três mulheres do planeta já foi espancada, forçada a ter relações sexuais ou submetida a algum outro tipo de abuso. A Organização Mundial da Saúde (OMS) complementa que a violência doméstica responde por aproximadamente 7% do total de mortes de mulheres entre 15 a 44 anos em todo o mundo.


De acordo com Patrícia Costa, antropóloga do Núcleo de Identidades de Gênero e Subjetividades da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), a violência doméstica está presente na sociedade e se manifesta de várias formas, como violência psicológica, moral, sexual e física, provocando consequências nefastas para vida das vítimas, e causando um sério problema de saúde pública ao País.

A antropóloga explica que são vários os fatores responsáveis pela violência de gênero. “No tocante a violência que atinge a mulher, destaco como alguns fatores que podem suscitar formas de violência: o preconceito, infelizmente, muito corrente em nossa sociedade; a dependência afetiva; o uso de drogas; ciúme doentio por parte do parceiro, além da tolerância cultural por parte da sociedade que pode ser aferida através de frases do tipo “tapa de amor não dói” ou “em briga de marido e mulher não se mete a colher”, entre outros”.

Hoje, como uma forma de justificar a violência, é muito difundida a ideia de que os homens violentos sofreram ou presenciaram atitudes violentas dentro de casa quando pequenos. Para o psicanalista Alex Simon Lodetti, essa afirmação, no entanto, é muito vaga. “Não há nenhum estudo científico que comprove isso. Essa ideia acaba sendo repassada socialmente, mas não tem muito fundo de verdade. Em uma das entrevistas com estupradores que eu fiz, por exemplo, dois oito entrevistados, apenas um havia sido violentado, fato que pode negar essa justificação”.

Brasil

No Brasil, dados divulgados pela Fundação Perseu Abramo revelam que mais de dois milhões de mulheres são espancadas a cada ano por maridos ou namorados, atuais e antigos, e que a cada 15 segundos uma brasileira é agredida por um homem. Já uma pesquisa realizada pelo DataSenado em 2007, constatou que apenas 40% das mulheres violentadas denunciam o agressor.

Segundo Patrícia, os motivos que podem fazer com que algumas mulheres não denunciem a violência sofrida são variados e dependem da subjetividade de cada pessoa, da afetividade, do ciúme e do grau de dependência econômica que envolve a relação.


No Brasil existem 387 delegacias especiais para atender mulheres agredidas. Na 6ª DP de Florianópolis, delegacia especial para mulheres, são atendidos, em média, 450 casos mensais, sendo que a maioria das denúncias é por difamação e calúnia. A violência doméstica compromete atualmente 10,5% do Produto Interno Bruto brasileiro.